Opinião Sexta-Feira, 06 de Setembro de 2024, 11h:00 | Atualizado:

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Sérgio Cintra

Suicídio: um tabu social e estatal, infelizmente

 

Sérgio Cintra

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Vivenciamos um mundo distópico – do não lugar – mas isso não é privilégio da contemporaneidade. Historicamente o ser humano é multifacetado e incongruente; mas jamais como neste século. Em meados do século passado, o grande conflito era o maniqueísmo Ser versus Ter e, com a Guerra Fria, Socialismo versus Capitalismo. Preponderaram o Ter e o Capitalismo.

Essa conjuntura histórica, aliado aos avanços tecnológicos, mudou para sempre as relações interpessoais e a própria maneira de se enxergar em sociedade.  Vive-se um momento antieuclidiano, no qual a racionalidade é apenas um dos componentes que influenciam o indivíduo em sua relação consigo, com a sociedade e com o planeta.

Parece contraditório: nunca se teve tanta interação (redes sociais) e nunca estivemos tão sós. Chico Buarque elegeu a saudade como “o pior tormento”; mas a pior das aflições contemporâneas é estar só em meio a pessoas, as consequências dessa solidão são devastadoras, implicando não apenas a profusão de transtornos mentais como também o aumento exponencial de suicídios. 

Segundo a Fiocruz as estatísticas brasileiras são alarmantes: “A taxa de suicídio entre jovens cresceu 6% ao ano no Brasil entre os anos de 2011 e 2022. Já as taxas de notificações por autolesões na faixa etária de 10 a 24 aumentaram 29% a cada ano nesse mesmo período.

O número foi maior que na população em geral, cuja taxa de suicídio teve crescimento médio de 3,7% ao ano e a de autolesão 21% ao ano, neste mesmo período. Esses resultados foram encontrados na análise de um conjunto de quase 1 milhão de dados, divulgados em um estudo publicado na The Lancet Regional Health – Americas, desenvolvido pelo Centro de Integração de Dados e Conhecimentos para Saúde (Cidacs/Fiocruz Bahia), em colaboração com pesquisadores de Harvard.” 

Há outras fontes e outras estatísticas; todas, invariavelmente, preocupantes. Com certeza a incompreensão do problema por parcela significativa da sociedade esteja relacionado à percepção das causas que levam alguém a atentar contra a própria vida, aliado aos tabus que cercam o tema, aliás, magnificamente retratado por Sófocles (496 – 406 a.C.) na tragédia grega “Ájax”.

A melhor maneira de compreendermos as atitudes suicidas e assim podermos evitá-las não é apenas enfatizando medidas individuais profiláticas de assistência e de saúde mental; antes, devemos encará-las com um problema social. No viés sociológico temos duas leituras obrigatórias: “O Suicídio” (Émile Durkheim – 1897), bastante difundida nos meios acadêmicos e “Sobre o Suicídio” (Karl Marx/ Peuchet – 1846), pouco conhecida, inclusive nas academias.

Durkheim descreveu três tipos de suicídio: o egoísta, o altruísta e o anômico, este o  mais presente na sociedade atual. Tal comportamento foi descrito, tendo como premissa o ensaio “Da Divisão do Trabalho Social”, a partir da constatação que a sociedade oriunda da 2ª Revolução Industrial estava “doente” por não conseguir reproduzir laços sociais como solidariedade, por exemplo, conduzindo o indivíduo à distopia por conta do desequilíbrio socioeconômico causado pela divisão do trabalho; porém, as “organizações” sociais poderiam mitigar o problema.

Já Marx, ao contrário de Durkheim, entendia que o modo de produção capitalista e suas relações sociais eram marcadas por contradições e pela luta de classes. Assim, analisando somente quatro casos de suicídio, na França do século XIX, causados, respectivamente, por difamação; por ciúme; por gravidez avuncular e por desemprego, Karl Marx   vaticinou: “Que tipo de sociedade é esta, em que se encontra a mais profunda solidão no seio de tantos milhões; em que se pode ser tomado por um desejo implacável de matar a si mesmo, sem que ninguém possa prevê-lo? Tal sociedade não é uma sociedade; ela é, como diz Rousseau, uma selva, habitada por feras selvagens.”

Que a saúde mental e o suicídio são um problema de saúde pública é indiscutível. A Organização Mundial da Saúde (OMS) apontou como principais causas de atitudes radicais como a do personagem Ájax da tragédia grega, o baixo nível socioeconômico e cultural; o padrão de vida familiar e lembranças de fatos negativos ocorridos durante a infância; o estilo de personalidade e os transtornos psiquiátricos.

Causas complexas e soluções ainda mais; todavia, é mister que o Estado e a sociedade priorizem maneiras de garantir a saúde mental dos cidadãos; especialmente a questão do suicídio para evitar que tornemos normal o que sempre foi anormal: ceifar a própria vida.

Sérgio Cintra é professor de Linguagens e está servidor do TCE-MT





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Comentários (2)

  • Xomano

    Segunda-Feira, 09 de Setembro de 2024, 10h10
  • Anualmente, 700 mil pessoas cometem suicidios no mundo, por diversos problemas, em diversas faixas etarias. Mas o cidadão que não sabe nem ler, aponta que o problema é uma "Geração chata e mimizenta".
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  • Geração chata e mimizenta

    Sexta-Feira, 06 de Setembro de 2024, 12h36
  • Povo anda muito fraco e é uma encheção de saco. Na verdade, não querem morrer, tem preguiça e querem atingir familiares enamorados(as) . Não tô com muita paciência não... Me desculpem mas não tô mesmo... Já viu morador de rua suicidar???? Claro que deve ter um caso ou outro mas ... nunca ouvi falar de nenhum caso. Não têm casa, comida, vida segura e estável... Um exemplo de vontade de viver.... Desculpe aí professor mas analisa aí o que eu falei. São pobres, muitas vezes viciados, não tem cama, nem banheiro, nem roupas, nem nada, só o dia e a noite.....
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