Uma série de conversas entre Maria Gladis dos Santos, a ex-contadora da Unimed Cuiabá na gestão do ex-presidente Rubens de Oliveira Júnior, mostram a pressão que a profissional sofria para “maquiar” os dados contábeis da cooperativa. Os prints do WhatsApp constam na defesa da contadora, que foi absolvida pelo Conselho Regional de Contabilidade de Mato Grosso (CRC-MT).

Ela foi denunciada e acusada por Rubens de ser a responsável por um prejuízo contábil de R$ 400 milhões na Cooperativa. As conversas mostram um cenário de pressão que a contadora sofria.

Em dado momento, o próprio ex-presidente questiona a profissional a respeito de um déficit, de então R$ 200 milhões, nas contas e balanços de 2022 da Unimed Cuiabá. “Gladis, fiquei preocupado com os 200 milhões! Por favor me mande a lista! No aguardo!”, diz Rubens.

A contadora responde “Dr., vou fazer um parecer de tudo que tem de pendências que deveriam estar lançados (sic) e até segunda lhe entrego”. O ex-presidente, no entanto, diz que “Não quero parecer! Quero informal. Pode me entregar em mão (sic) por favor”. 

Em outro print, é a superintendente administrativo-financeira à época, Ana Paula Parizotto, que deixa clara a intenção de mostrar que as contas da Unimed Cuiabá estão positivas ou, no mínimo, sem débitos. A conversa se inicia com Ana Paula, que era superior da contadora, questionando um valor de R$ 7 milhões.

A profissional responde que a cifra é proveniente de juros de parcelamento de tributos federais. Após a resposta, Ana Paula diz “a gente havia conversado que não iria lançar isso esse ano, né? Porque com esse lançamento de sete milhões, a gente não consegue de forma nenhuma chegar no resultado que a gente precisa. A gente tinha conversado que não ia lançar esse ano. Se você puder rever isso, me dá um retorno, fazendo um favor”. A contadora responde que a auditoria já havia pedido para atualizar as dívidas e que os parcelamentos não teriam como não serem lançados se já estavam até no contas a pagar. “O que a gente não lança é o juro que ainda vai correr, mas isso aí é tudo de despesa corrida”, detalha. 

Em outro momento, a superintendente informa à contadora que se o Conselho Fiscal solicitasse balancete fiscal, ela deveria alegar que o mesmo não havia passado pela Diretoria Executiva. De fato, o Conselho pede e Ana Paula fala para não mandar. 

Ao longo dos dias, Ana Paula Parizotto insiste. “Vamos ver o que da pra retirar pra fechar o resultado pelo menos positivo. Não precisa ser um valor expressivo. Mas precisa ser positivo”. 

A contadora afirma que recalculará a multa, mas a superintendente afirma que “ainda não dá positivo. Precisamos reverter. (...)”. E ela continua insistindo: “de qualquer forma preciso reverter o resultado pra positivo. Se vc disser que não há o que tirar mais vou buscar outra opção”.

Conforme apontou a defesa da contadora ao CRC-MT, a preocupação dos gestores da época era apresentar um balanço que não mostrasse o rombo aos cofres da cooperativa e, por isso, a vontade incessante de Ana Paula, Rubens e do CEO Eroaldo de Oliveira em deixar as contas positivas. A atual diretoria da Unimed Cuiabá assumiu em março de 2023, na mesma Assembleia em que as contas da gestão anterior foram reprovadas. Em razão da reprovação, de imediata uma auditoria independente foi iniciada.

O relatório, apresentado no mês de junho de 2023 em Assembleia Geral, mostrou resultado líquido negativo de R$ 400,7 milhões no balanço fiscal de 2022, contrapondo os R$ 371,8 mil positivos que haviam sido apresentados pela gestão anterior. Além das evidências de um rombo, foi exposto na AGE que a gestão de Rubens havia ignorado as notificações da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), órgão que regulamenta as operadoras de planos de saúde. De 2018 a 2022, a ANS fez oito notificações à ex-diretoria sobre as desconformidades fiscais que já estavam sendo identificadas. 

A atual diretoria respondeu a ANS e apresentou plano para sanar as irregularidades. Dentre as medidas do Plano de Ação estavam orçamento rígido das despesas administrativas e capitalização imediata de R$ 150 milhões via operação de crédito junto ao sistema financeiro.

Em meio a esta situação, a atual diretoria recebeu a notícia da ANS da nomeação de um diretor fiscal, medida interventiva. O diretor fiscal da ANS foi nomeado em 1º de setembro de 2023, com o prazo de 24 meses de atuação, podendo ser prorrogado. O propósito é que a ANS acompanhe de perto tanto a qualidade e continuidade da prestação dos serviços aos beneficiários como o plano de ação desenvolvido pela atual diretoria, que visa reequilibrar as contas da Cooperativa.

Em maio deste ano, o ex-presidente da Unimed Cuiabá Rubens de Oliveira Júnior e a médica Suzana Aparecida Rodrigues dos Santos Palma, ex-diretora administrativa-financeira, foram processados administrativamente. Por unanimidade, ambos foram eliminados em 18 de maio de 2024, em AGE. Rubens também foi desligado da Federação Unimed Mato Grosso e das funções que ocupava na Unimed Brasil. A representação contra ambos foi feita pela atual Diretoria Executiva da Unimed Cuiabá, que também tomou providências nas esferas cível e criminal.